ENTREVISTA

Fabi elege medalha favorita e vê Seleção com potencial para o Mundial

Bicampeã olímpica em Pequim-2008 e Londres-2012 também fala sobre a vida de palestrante e comentarista na TV

Fabi Alvim compartilhou experiências e conduziu o II Fórum Mulher no Esporte, do COB, em abril -  (crédito: Helena Barreto/COB)
Fabi Alvim compartilhou experiências e conduziu o II Fórum Mulher no Esporte, do COB, em abril - (crédito: Helena Barreto/COB)

Rio de Janeiro — Quem se recorda de Fabi enérgica em quadra nas campanhas vitoriosas da Seleção Brasileira de vôlei nos Jogos de Pequim-2008 e Londres-2012 ou comentando nos canais do Grupo Globo talvez não conheça a versão palestrante da líbero. A baixinha de 1,66m se agiganta no palco, abre o coração e compartilha a história pessoal, intitulada de "Além do que se vê", como foi na abertura do II Fórum Mulher no Esporte, promovido pelo Comitê Olímpico do Brasil (COB), em abril. 

A reportagem acompanhou de perto a versão palestrante e mestre de cerimônia de Fabi. Em um evento pensado para discutir a presença, os avanços e os desafios das mulheres no esporte, Fabi não tinha um pingo de vaidade. Aliás, fez questão de salientar que detesta falar de si. Porém, entende ter vivências que se misturam com as de outras personagens. 

A viagem pela história de Fabi começa em Irajá, subúrbio da Zona Norte do Rio. Filha da manicure Dona Vera e do taxista Seu Maurilio, foi criada em um lar de flamenguistas. Na esteira das conquistas da geração rubro-negra 1981, aventurou-se no futebol. O fato de jogar com meninos incomodava a vizinhança. Afinal, ela era a única. Fabi conta sobre a fofoca dos vizinhos para o pai. O relato gerava uma cobrança na mãe. 

Naquela época, Fabi não tinha o discernimento do que era brincadeira de menino ou de menina. O cenário fez com quem ela aprendesse desde cedo a arte de argumentar. Corajosa, lembra com carinho de ter ido atrás das oportunidades. "Infiltrou-se" no meio contando placares, jogou torneios em estacionamentos de shopping e foi agraciada com invenção da função de líbero, abandonando o papel de atacante. Assim como a maioria dos atletas, foi inspirada pela geração de prata em Los Angeles-1984. Porém, a conquista que mexeu com coração dela foi o ouro masculino em Barcelona-1992. 

Há 17 anos, Fabi conquistou um ouro para chamar de seu. Repetiu a dose em 2012 e tornou-se inspiração. Embora tenha saído do vôlei, a modalidade não saiu dela. Em entrevista Correio, a bicampeã olímpica fala sobre a responsabilidade de comentar na TV o segundo esporte mais popular do país, detalha sobre a versão palestrante, memórias com Brasília e, claro, dá pitacos com a Seleção feminina no ciclo rumo a Los Angeles-2028. 

Como tem sido palestrar?

Para mim, era muito mais fácil jogar. Mas tenho curtido esse lugar do debate, da discussão, de alguns avanços, especialmente nesse lado da mulher. É um marco, se imaginarmos que estamos no segundo fórum, uma área com atenção do COB. Conseguimos mensurar, de Maria Lenk para cá, quais foram os avanços, onde estamos. É fazer um pouco desse check-up do que foram os Jogos Olímpicos, dessa participação feminina, que foi tão celebrada. Mas mais do que refletir é entender que estamos avançando. Muita vezes, quando damos um o, as pessoas e o sistema se acomodam um pouco. Esse debate é justamente para isso para mantermos a guarda alta, para que se discuta, que a gente converse. É um ecossistema. Estou orgulhosa de estar aqui e de contribuir um pouco para isso, e tentando me divertir. Essa parte de ser mestre de cerimônia é muito mais de conduzir, mas também de se divertir. De alguma maneira, estou aprendendo, escutando e tentando fazer desse evento leve. 

A TV virou sua nova praia?

Acho que consegui evoluir. Ao fim da carreira de atleta, fui enfrentar novos desafios. Esse desafio foi comentar esporte na televisão, fazer com que as pessoas entendessem da modalidade. É um desafio duríssimo, pode parecer simples, mas é uma rotina de preparação, dedicação e de tentar trazer uma maneira de comentar de maneira mais uma humana. Ao mesmo tempo, estou fazendo uma parceria com o Marcelo Barreto, no universo olímpico. Fazer parte desse Movimento Olímpico fora das quadras também é divertido, poder conhecer novas modalidades a fundo, entender os dilemas. Estou cada vez mais me sentindo à vontade e me encontrando nesse caminho do pós-carreira, que não é simples. Não somos tão estimulados para nos preparar para esse pós, mas estou feliz e orgulhosa. Dá aquele frio na barriga ao subir ao palco para tentar trazer alguma coisa que agregue. 

Como enxerga esta geração da Seleção feminina? 

O vôlei tem sido um esporte bastante linear. O feminino, especialmente, conseguimos nos sustentar um pouco melhor nesse sentido das safras, das gerações. Conseguimos nos manter em um nível competitivo, talvez não no primeiro lugar do pódio, mas subindo a ele, que é o mais importante. Temos uma geração para brigar, temos mudanças no cenário internacional, com dois Campeonatos Mundiais entre os ciclos. No ado, ele era feito a cada quatro anos. Agora, a cada dois. Aumentam as possibilidades, mas aumenta-se a competitividade por esse título tão almejado.  Nos vejo em condições de seguir brigando por pódio. É o mais importante, construir novos ídolos. Temos a Gabi nessa esteira de atletas que estimulam, lideram e são exemplos para outras. 

Então, você está confiante?

Em ordem de prioridade, o Campeonato Mundial deve ser a primeira opção. De repente, o Zé pode usar essa Liga das Nações para fazer algumas experiências, para dar descanso a algumas e fazer testes. Tenho certeza de que vamos chegar com um time em condições de competir no Mundial e, quem sabe, subir ao pódio de novo. 

Bernardinho revelou que não gostaria que a Seleção masculina estreasse no Rio. O que você acha? 

Pressão teremos em qualquer lugar. Há uma cobrança porque o torcedor vai ver a Seleção, é apaixonado pelo vôlei masculino e feminino. Essa atmosfera criada é de expectativa, mas o Bernardinho e o Zé Roberto são os que mais conhecem e entendem desse ambiente. Não tenho nenhuma dúvida de que vão saber lidar com isso. No ado recente, a gente não tinha a chance de jogar no Brasil. Posso contar na mão quantas vezes nossa geração teve possibilidade de jogar no Brasil. Essa joga há mais tempo. É um motivo de celebração também jogar diante da torcida. Também é para a galera tentar entender o momento da Seleção, o que será que os treinadores programaram para a semana de jogos aqui. As responsabilidades e cobranças são gigantes quando se veste a camisa da Seleção. 

E a sua história com Brasília? 

Joguei final de Superliga em Brasília, no Nilson Nelson. Também joguei pela Seleção. A imagem que fica para mim foi uma vitória contra o Praia, em 2015, em um Nilson Nelson lotado. Não tinha time de Brasília na decisão, mas o torcedor foi e prestigiou, participou, torceu. Foi uma festa linda naquele ginásio tão emblemático, que já viu tantas e tantas batalhas acontecerem. Tenho boas recordações. Agora, elas também são do lado de fora, como comentar jogo na Seleção lá. Foi um carinho que há muito tempo eu não via, mesmo. Vi torcedores na porta do hotel, é o carinho e o reconhecimento pelo sucesso do vôlei. 

Qual é a sua medalha olímpica preferida? 

Difícil. Sempre coloco a de Pequim-2008, muito mais por ser a primeira. A de Londres-2012 foi a mais difícil, a gente sabe da história. É difícil escolher uma. Tenho mais como um símbolo aquela vitória de 2008, porque coroou tantas mulheres, desde a primeira participação olímpica, em 1980, para 28 anos depois, conquistarmos a primeira medalha de ouro. Aquela medalha foi construída a muitas mãos e tem esse simbolismo. Mas que pergunta difícil. 

O que achou da temporada do Brasília Vôlei?

Vimos a Ana Medina fazendo um grande campeonato. A gente sempre olha para as projeções dos times conforme os investimentos. Acho que mais do que a situação que ficou o time (brigando contra o rebaixamento) há a importância de se ter a diversidade dentro da Superliga, contemplar diversos lugares do Brasil. Isso que é importante. Foi um time que deu dificuldades a todo mundo que jogou lá, em casa, foi uma equipe aguerrida até o fim. Os brasilienses certamente estão contentes de terem visto as expectativas serem correspondidas. Dá o orgulho de ver um time jogando com determinação. A minha torcida é para que sempre haja investimento maior para que a disputa se permeie pela parte de cima da tabela e fique cada vez mais imprevisível.

O repórter viajou a convite do Comitê Olímpico do Brasil (COB)

postado em 06/06/2025 06:00
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